Neste artigo falaremos sobre as ordens de ajuda. Mas você sabe do que se trata?
É necessário atenção e presença quando nos colocamos num caminho profissional que está ligado a ajudar outras pessoas. Este movimento, que é belo quando alinhando com um bom propósito, pode também esconder nuances não tão positivas entre o “ajudador” e o “ajudado”.
Bert Hellinger escreveu um livro chamado “As Ordens da Ajuda”, onde ele descreve a sua percepção sobre este assunto na sua longa carreira como um profissional da ajuda.
O psicoterapeuta alemão descobriu que há algumas boas posturas para que a ajuda não se converta em algo que martiriza ou diminui o ajudado. Nesses dois lugares, aquele que recebe ajuda está com menos opções de avançar em direção à solução de seu problema e retornar para um bom caminho de vida.
Há uma qualidade básica na ajuda: reconhecer no outro a capacidade de lidar com a sua própria realidade e história. Aquele que oferece ajuda está sendo apenas uma lanterna, que traz luz para momentos onde a visão está obstruída pela escuridão.
Iluminar o caminho
Ver-se como lanterna é reconhecer que o outro está no controle da sua vida, e que a ajuda vai ser recebida até onde o outro a permitir. Um bom ajudante somente ilumina.
As ordens de ajuda dizem que somente quem recebe a ajuda é capaz de fazer algo com o que vê. Há um limite claro de até onde um ajudador pode ir.
Também um bom ajudante não se enche de expectativa do resultado da sua ajuda. Ele deixa o caminho livre para que os outros se movimentem do jeito que melhor cabe a cada um. Ao deixar o outro livre, o ajudador também está livre, e se movimenta levemente na direção do seu próprio destino.
Dessa forma permanece capaz e disponível de “clarear” o campo de visão de outras pessoas, sendo uma ajuda que respeita o outro e seu destino.
As 5 Ordens da Ajuda
Bert Hellinger trouxe em “As ordens da ajuda” algumas questões a se prestar atenção quando nos colocamos como profissionais em uma área de apoio, como a dos médicos, psicólogos, psiquiatras, terapeutas, etc.
“As ordens da ajuda das quais falo aqui, têm a ver com a ajuda como profissão, não com a ajuda interpessoal. Há uma diferença entre as duas. A ajuda como profissão é uma arte, uma habilidade de saber como. Sobretudo, precisamos saber como fazer para não nos deixarmos ser envolvidos em um relacionamento.” – Bert Hellinger, sobre este tema no livro “O amor do espírito”.
O psicoterapeuta alemão não coloca as Ordens da Ajuda em ordem de importância. Aqui, enumeramos simplesmente com o fim de organização e clareza de conteúdo. Leia e aprenda um pouco mais sobre essa incrível postura.
Ordem da Ajuda #1
Dar apenas o que se tem, e pegar para si somente o que se necessita. Dessa forma, quem ajuda e quem é ajudado é beneficiado mutuamente nesta troca equilibrada. Quando isso não ocorre, as desordens aparecem:
- Querer dar o que não tem.
- Querer tomar algo que não precisa.
- Esperar e exigir de outra pessoa o que ela não pode dar.
- Tirar a responsabilidade de uma pessoa sobre algo que só ela deva ou precisa carregar sozinha.
Essa ajuda é humilde. Ela renuncia com arte. Pode contradizer ideias tradicionais, onde para sermos “bons” temos que estar sempre dispostos a ajudar. Por isso, esta também é uma atitude corajosa, pois reconhecer seus limites é por vezes se indisponibilizar a ajudar.
A arte de permanecer dentro das possibilidades que a realidade apresenta, sendo, onde possível, um verdadeiro vetor para ajudar. Estar atento aos limites no dar e tomar, pois o desequilíbrio também traz dificuldades no processo de ajuda.
Ordem da Ajuda #2
Submeter-se às circunstâncias é reconhecer a realidade e suas limitações e desse lugar, reconhecendo o que é possível, ajudar. Este é um movimento discreto e humilde, onde o ajudador perde protagonismo.
Porém, é um lugar de grande força. As desordens dessa ajuda são:
- Negar ou encobrir as circunstâncias.
- Querer ajudar enfraquecendo tanto a si como ao que pede tal ajuda.
Quando reconhecemos o verdadeiro e concordamos com ele, nos colocamos alinhados à força da própria vida, sem que seja necessário colocar nossas idéias ali. Essa postura se mostra com grande força e utilidade.
Ordem da Ajuda #3
Colocar-se diante do cliente como um outro adulto, reconhecendo nele as possibilidades que ele têm para alterar seu destino e dificuldades, cria um campo onde ambos estão mais fortes para avançar na direção de uma solução.
Também não sair de seu próprio lugar como ajudante para ocupar o espaço trazido pelas queixas do cliente, tentado suprir algo que “aparenta” estar vago, é outra característica da postura que um verdadeiro ajudador pode ter.
As desordens aqui são:
- Permitir reivindicações infantis.
- Tratar o cliente como uma criança.
- Poupar de algo que o cliente mesmo precisa carregar – a responsabilidade e as consequências.
Reconhecer o cliente como um adulto capaz é o primeiro passo para que o cliente também se perceba como tal, e dessa forma se apodere das possibilidade de mudança. Dessa forma, ele caminha adiante com sua própria força e capacidade.
Ordem da Ajuda #4
Olhar somente para o cliente dá ao terapeuta uma imagem incompleta do quadro. É necessário considerar todo o sistema no qual o cliente está envolvido. É importante aqui incluir, respeitosamente e com amorosidade, outros membros que se relacionam com o cliente, sendo os mais importantes os pais.
As desordens são:
- Desrespeitar ou ignorar outros membros da família.
- Não olhar para aquele membro excluído da família que tem nas mãos a chave para a solução.
- Não perceber as reivindicações infantis diante da dureza da empatia sistêmica necessária para uma solução como liberação e fonte de força.
- Deixar de olhar para algo maior, algo além do cliente e se curvar diante disso.
Somente na inclusão de todos que podem estar presentes na queixa do cliente reside uma boa chave para que se possa olhar para uma solução.
Se o terapeuta “embarcar” na visão do cliente sobre o problema, ele próprio estará tirando de vista informações importantes que podem ser vitais para trazer o distensionamento do sistema e, consequentemente, do que pode estar trazendo dificuldades para a vida do cliente.
Ordem da Ajuda #5
Amar e respeitar as pessoas pelo que são é lidar com a realidade do seu próprio destino. Ao terapeuta, esta postura é facilitada pela falta de envolvimento afetivo com as pessoas que chegam junto ao problema do cliente. Ao assumir esta postura, o terapeuta serve como ponte para uma nova forma de olhar para aquele que busca ajuda, para lidar com suas dificuldades.
As desordens aqui são:
- Julgamentos.
- Condenação.
- Indignação moral.
Incorrer em qualquer uma dessas desordens afasta o ajudador da real possibilidade de ajuda, pois assim o terapeuta corre o risco de ser um amplificador das dificuldades do cliente, ao invés de oferecer uma nova possibilidade de lidar com estas questões. O cliente então fica estacionado, sem movimento para levar sua vida adiante.
A Alma abrangente – um texto de Bert Hellinger
“Existe a experiência de que nos movimentamos num campo através do qual temos uma percepção. Se olho para alguém, reconhecendo-o e vendo-o, e se essa pessoa me olha, vendo-me e reconhecendo-me: como isso é possível?
Se imaginar que aquilo que estiver vendo da outra pessoa está apenas no meu cérebro, e se a pessoa imaginar que tudo que estiver vendo de mim está apenas no seu, nesse caso estaríamos nos vendo?
Podemos realmente ver um ao outro? A pessoa está no meu cérebro e eu no seu? Isto é ridículo.
Eu a vejo ali e ela me vê aqui. Eu não a vejo no meu cérebro e ela não me vê no seu.
O que nos conecta e possibilita reconhecermos um ao outro é uma alma que nos abrange. Nessa alma eu abranjo a pessoa e ela a mim. Nessa alma em comum nós nos reconhecemos. Essa alma é extensa, não apenas em relação ao espaço, mas também em relação ao tempo.
Assim sendo, os mortos também estão presentes nessa alma. Tudo que já existiu nesse campo, tudo que já passou atua sobre mim. Estou em ressonância com tudo que foi.
Se houver uma perturbação nesse campo, por exemplo, se houve um crime na minha família e existe um assassino e uma vítima, estou em ressonância com eles. Eles me influenciam. Estou entregue a eles através desse campo.
Muitos clientes também estão entregues a um passado através desse campo, por exemplo, a um assassino e a sua vítima.
Nesse campo podemos restabelecer a ordem em relação a algo, posteriormente. Por exemplo, quando é possível juntar o assassino e sua vítima nesse campo, para que se percebam, amem-se, para que façam as pazes. Então, nesse campo algo muda. Algo no passado mudou e tem um efeito reconfortante no presente. Isso significaria curar algo.
O ajudante que conhece essas ligações interfere nesse campo de forma apaziguadora. Assim a terapia fica sob uma luz totalmente diferente.
Aquilo que podemos e eventualmente devemos fazer, e aquilo para que temos que nos abrir e preparar, de repente aparece sob uma luz diferente. Em que formação isso é levado em consideração?
E quão pouco podemos fazer se não considerarmos esses fatos, se não sentirmos em nós mesmos essa ressonância, se não a percebermos e aprendermos a lidar com ela?”